1 – Qual foi o seu primeiro contato com a arte literária? Como se deu o interesse?
Resposta: Foi aos 11 anos de idade. Eu estava na 4ª série primária e a escola onde eu estudava estava promovendo, pela primeira vez, um evento literário chamado ‘’Criar’’. Todos os alunos tinham de produzir poemas, e os selecionados iriam ser publicados em um livro. O meu texto foi um dos selecionados e até a 8ª série eu permaneci publicando neste evento. Mas foi no ensino médio que tudo se consolidou, quando conheci o professor de literatura e também poeta David Bellmond. Ele passou a direcionar algumas leituras para mim e foi um dos primeiros leitores dos meus poemas. Depois acabou prefaciando o meu livro.
2 – Quais foram os autores que mais influenciaram o seu fazer poético?
Resposta: Eu acho que acabo sofrendo influência de tudo que leio. Não sei se isso é algo bom ou ruim, mas faz parte da formação de todo o escritor. Tento ter o cuidado de reter o que há de bom nas coisas que leio e expurgar aquilo que não acho interessante. Nomes como Drummond, Oswald de Andrade, Mário de Andrade e Rosa são referências constantes no meu trabalho.
3 – Como e quando surgiu a idéia de seu primeiro livro? Fale-nos acerca de “Cenho”.
Resposta: Como comecei a publicar os meus rabiscos bem cedo, o desejo de ter um livro só meu era uma ideia fixa. Cheguei a organizar um livro em dupla com um amigo meu, mas por falta de condições o projeto não saiu do papel. Aí iniciei, até a minha entrada no curso de Letras na UFES, uma fase mais marginal, onde eu fazia os textos, tirava cópia e dava para algumas pessoas lerem. Isso foi importante, pois passei a ter várias opiniões sobre aquilo que eu escrevia, revi alguns posicionamentos e abandonei alguns cicerones poéticos. Na UFES, eu pude encontrar espaço para discutir literatura e ler com mais qualidade. Quando conheci o amigo e poeta Ricardo Salvalaio, entusiasta das letras, pude voltar a sonhar com o livro. Salvalaio foi decisivo na formatação do projeto ‘’Cenho’’ e o livro acabou saindo pela Lei Rubem Braga. Aí, eu aproveitei bastante do que já tinha pronto do projeto em dupla, adicionei alguns poemas de quando eu já cursava Letras e o resultado é o ‘’Cenho’’, um livro onde se vê claramente um processo de evolução criativa e fases distintas de vivência.
4 – Percebemos que sua obra sofreu uma grande influência da Escola Romântica e, logicamente, de Álvares de Azevedo. Como você explica tal assertiva?
Resposta: É algo de encantamento juvenil. Como eu comecei a escrever bem cedo, Álvares de Azevedo foi um dos meus primeiros cicerones poéticos. E como ele é um autor que também encanta por sua biografia controversa, eu mergulhei fundo na leitura de livros como ‘Lira dos vinte anos”, “Macário” e “Noite na taverna”. Daí as várias referências em ‘’Cenho’’. Soma-se a isso tudo, o discurso de Renato Russo em seu último disco, “Legião Urbana - A tempestade ou O livro dos dias”, o ambiente nebuloso, a melancolia, as saudades, as despedidas, tudo isso, ao me ver, dialogava também com o Romantismo de Azevedo. E sendo Russo também um grande cicerone, me influenciei bastante. Mas atualmente isso não é mais tão assim (risos).
5 – Como funciona seu processo criativo? Mais inspiração ou mais expiração?
Resposta: No início era mais expiração. Como eu me influenciei bastante pelo Romantismo, acabei concebendo uma literatura bastante pautada na subjetividade. Não que isso seja algo ruim, mas hoje vejo que é complicado expor em seus textos seus dramas pessoais, espécie de desabafos-vômitos-poemas. Hoje tento conciliar as duas instâncias. Mas em geral, meus textos nascem de situações cotidianas, depois acabam sendo mais maturados, até que os expurgo de vez.
6 – O que você pensa do nosso atual cenário literário?
Resposta: Sinceramente, é triste. Faz muita falta no Espírito Santo a existência de uma editora. Não temos. Temos gráficas que até fazem um trabalho editorial interessante, mas pecam na divulgação e distribuição dos livros que publicam. As leis de incentivo à cultura tem feito um trabalho interessante disponibilizando verba para os artistas, mas ainda é pouco para um estado como o nosso, que infelizmente é muito provinciano em matéria de literatura. Mas o problema não é só isso. Alguns editais de incentivo à cultura acabam publicando sempre os mesmos artistas, que se revezam no monopólio. É lamentável que alguns deles, além de monopolizarem o cenário, fechem-se em seus discursos e não aceitem que artistas talentosos possam aparecer. Tudo bem que literatura também é um espaço político, mas não há necessidade de politicagens. Existem alguns autores que nunca publicaram por incentivo próprio e curiosamente publicaram suas principais obras na mesma lei de incentivo. É lamentável que isso aconteça.
7 – Segundo Chico Buarque, a literatura de nosso século se alimenta de várias mídias, como o cinema e a música. Em seu estro, outras artes também perpassam?
Resposta: No Brasil, quem faz arte não tem do que reclamar no que diz respeito à riqueza cultural. A música é algo maravilhoso e o cinema vem numa crescente, o que fomenta boas influências. A minha poesia dialoga o tempo todo com a MPB. Além de Renato Russo, Chico e Caetano são referências para mim.
8 – Quais são seus novos projetos literários?
Resposta: Há tempos venho trabalhando no livro “Entre ver e tocar há dores”, minha próxima obra. A obra será parte contos parte poemas. Em todos os textos, de uma forma ou de outra, irão conter três signos: a visão, o toque e a dor. Nos poemas, apresentarei algo bastante diferente do que o leitor viu em ‘’Cenho’’. E na prosa apresentarei uma linguagem bastante enxuta, próxima dos microcontos. Será um prazer compartilhar com “Outros 300” alguns textos que farão parte da obra. Agradeço a oportunidade de falar com vocês!
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