Fernanda Takai em “Onde brilhem os olhos seus”
(2007), um disco contendo somente canções gravadas por Nara Leão, provou que
era muito mais do uma cantora da banda de pop-rock Pato Fu. Na obra, ela soou
cool, criativa, versátil e com uma voz ainda mais encantadora e doce. Agora, Takai
lança ao lado de Andy Summers, ex-Police, o CD “Fundamental”, que contém onze músicas inéditas. As canções foram
compostas por Summers especialmente para a voz de Fernanda, e cinco delas
ganharam versões em português feitas por ela, seu marido, John Ulhoa, e Zélia
Duncan. A ideia do disco em parceria partiu de Andy, que ficou encantado com o
timbre sutil da voz de Fernanda após assistir ao documentário “United Kingdom Of Ipanema” - que ele
estrela junto do músico Roberto Menescal, e no qual a cantora brasileira participa
na música “Insensatez”. O inglês Andy Summers, considerado o 85º melhor
guitarrista de todos os tempos pela revista norte-americana “Rolling Stone”,
se encantou: “A voz dela tem luz, é diferente das outras cantoras”, revela. Ao
final, eles selecionaram 11 de 25 canções. Além de tocar guitarra, Summers
assina também os arranjos e a produção do disco.
“Orfeu
Negro”
A obra da dupla é toda pautada pela Bossa
Nova. Segundo Andy Summers, o gênero está em seu imaginário desde seus 16
anos, quando assistiu ao filme “Orfeu
Negro”. Além da Bossa,
Summers também tem influência do jazz e seus trabalhos solo trazem essa forte inclinação
para toques de música erudita e World Music. Charles Mingus, Wayne Shorter e
Thelonius Monk são algumas de suas influências. Por outro lado, são
inesquecíveis os solos e dedilhados em clássicos do pop como “Roxanne” ou “Message In A Bottle”, canções do The
Police que são referências para várias gerações. Em “Fundamental”, mesmo a Bossa
Nova perpassando o álbum como um todo, também há espaço para outros gêneros,
como jazz-samba, baião, pop, rock. No
entanto, a Bossa serve como base de versos líricos e de timbres de guitarras e
teclados (tocados por Summers) que em tudo remete à densidade pop britânica que
o guitarrista ajudou a construir. A percussão acústica do brasileiro Marcos
Suzano e o suingue mexicano do experiente Abraham Laboriel (baixo) também
ajudam a criar um clima muito original. Algumas faixas do disco também contam com as
guitarras do marido e eterno parceiro de Takai, John Ulhoa.
As
canções
“Fundamental”, canção homônima, abre o disco e tem
toques bossa-novistas à la Menescal. A letra romântica, como em “Wave” (Tom
Jobim), prega que não devemos ser sozinhos: “o nosso amor é fundamental”. Já “Smile
and blue sky me” lembra o lirismo e os vocais de Paul McCartney. Na verdade, a
tônica das letras do disco é o amor e suas relações. O soft-baião “Pra não
esquecer” (I remember) também segue essa linha romântica ao tratar daqueles
amores perdidos e não correspondidos (típicos das letras de Bossa). A batida perfeita
de Marcos Suzano, a voz doce de Takai e a participação de Zélia Duncan o transformam
num dos melhores momentos do CD. “Sorte no amor” (Music in the darkness) tem
forte influência da MPB. O lirismo aqui presente revela que mesmo numa era
superficial como a nossa, em que todos escondem seus sentimentos e ninguém é
verdadeiro, o amor deve existir: “Numa doce entrega tudo é mais real/ Bate um
coração de paixão/ O amor ideal. [...] Indo pro futuro/ Não há matinê, mesmo no
escuro/ A força do amor/ Brilha em você”. Ademais, “Chuva no deserto”
(Teardrops in the sea) tem forte influência latina, com ótima guitarra no
estilo Santana. Destaque também para os teclados de Summers e para os belos
versos: “Por que eu amo tanto?/ Isso é tão estranho, louco/ Pode ser só
devaneio/ Sonho assim o dia inteiro/ No amor, metade é ilusão”. “No mesmo
lugar” (Here i am again), por seu turno, é uma bossa por excelência. Tanto tem
letra quanto em melodia. Talvez seja a faixa que mais resuma “Fundamental”. “I
don’t love you” é a faixa mais pop-rock da obra, ela é a que mais tem uma
sonoridade oitentista e, por isso mesmo, lembra até o grupo Pato Fu. A letra
elenca as contradições do amor: “Eu não te quero, mas te amo. Deixe-me agora,
mas sempre esteja aqui, eternamente”. “Human Kind” é um pequeno e lindo blue. A
voz sutil de Fernanda Takai remete àquele clima jazzístico dos anos 40 e 50.
Por
tudo isso, “Fundamental” é um disco no melhor estilo “um banquinho, um violão”
e essencial para quem também acha que o amor é fundamental.
(Texto de Ricardo Salvalaio
publicado no Caderno Pensar, do jornal A Gazeta, no dia 10/11/2012)
Nenhum comentário:
Postar um comentário