O compositor brasileiro que melhor traduziu as rugas, a tristeza e a saudade para o universo do samba faria 100 anos em 2011 se ainda estivesse vivo. Nascido em 1911 e morto em 1986, e devidamente homenageado em vida, Nelson Antônio da Silva, o Nelson Cavaquinho, tem sua obra celebrada no CD “Uma flor para Nelson Cavaquinho – 100 anos”.
Idealizado e produzido por Thiago Marques Luiz, o álbum traz 21 músicas reunidas em 20 faixas. Em cada uma um intérprete diferente, a maioria acompanhada por uma banda liderada pelo violonista e arranjador Rovilson Pascoal e o baixista André Bedurê.
Como sempre ocorre nesses discos de tributo, a eficiência e a pertinência das releituras são variadas. E seu sucesso depende não só do alinhamento das vozes com a obra quase sempre densa de Nelson, como com o grau de ousadia e de originalidade das versões. Na maior parte dos casos, ganha quem arrisca mais ou quem não sai de seu quadrado.
Daí que quem soa mais criativo e ousado é Arnaldo Antunes, que comanda uma releitura quase roqueira, cheia de violões repetitivos e guitarra rascante, de “Luz negra”, e Zeca Baleiro, que conta com o clima dos teclados de Sacha Amback, a guitarra e os samplers de Érico Teobaldo para dar um ar de trilha de Angela Badalamenti para “Juízo final”. A jazzista Tânia Maria, mais conhecida no exterior do que no Brasil, inova ao dar merecido status de standard a “Folhas secas”.
Pelo respeito e pela contenção, a maranhense Rita Ribeiro (“A vida”), a paulista Cida Moreira (“Ninho desfeito”, que divide a faixa com a “Beija flor” de Zezé Motta), o negro gato Luiz Melodia (“Degraus da vida”) e Angela Ro Ro (“A flor e o espinho”) acertam na classe da condução de suas faixas.
Intérpretes mais específicos da área do samba mais acertam do que erram. Leci Brandão (“Palhaço”), Teresa Cristina (“Quero alegria”), Graça Braga (“Fora do baralho”) e até o quase sempre exagerado Diogo Nogueira (“Cuidado coma outra”) estão à vontade, ao lado, claro, da mais célebre intérprete da obra de Cavaquinho, Beth Carvalho, que parece pisar serenamente em folhas secas na sintomática “A Mangueira me chama”.
Festejados intérpretes da nova cena , como Marcos Sacramento (“Doca Carola”), Fabiana Cozza (“Pranto de poeta”, com interpretação um grau acima do necessário) e Verônica Ferriani (“Se você me ouvisse”) não empolgam nem escorregam, enquanto Benito di Paula não convence na versão voz e piano de “Rugas”, enquanto Emílio Santiago usa a experiência de crooner e desliza fácil por “Minha festa”.
Alcione, que, com todas as honras da casa, abre o disco com “Quando eu me chamar saudade”, entre violão e violoncelo, tem tudo para criar polêmica. Dramática, solta o vozeirão sobre os versos emblemáticos, como se baixasse uma Elza Soares a reclamar as flores em vida.
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