sábado, 20 de setembro de 2014

CADÁVER SOBRE CADÁVER. CRÍTICA DE "NHEENGATU", NOVO ÁLBUM DOS TITÃS.


Em maio, o grupo Titãs finalmente saiu do limbo com o excepcional disco “Nheengatu”. Entretanto, ao contrário do volátil e desnecessário álbum “Sacos Plásticos” (2009), que focava em baladas românticas e sons eletrônicos, o novo trabalho tem ares rock ‘n’ roll e abusa de letras ácidas. Nada escapa aos roqueiros oitentistas, a obra versa sobre os problemas atuais no país: pedofiliaviolência policial, preconceito, racismo, pobreza e drogas.

“Nheengatu” significa “língua geral" e é uma referência à língua artificial criada pelos jesuítas no Brasil para facilitar a compreensão entre os povos indígenas e os colonizadores portugueses. A capa, por sua vez, é baseada na pintura “Torre de Babel”, de Pieter Bruegel, a qual retrata a mítica torre construída para se alcançar os céus, mas destruída pela ira de Deus, o que resultou na dispersão dos homens pela Terra, que então passaram a desenvolver idiomas próprios e não mais se entenderam. Desse modo, o conceito do álbum é dar voz a quem normalmente não tem voz e nem vez. “Nheengatu” é a junção das temáticas de “Cabeça Dinossauro” (1986), da crueza de “Tudo ao mesmo tempo agora” (1991) e da pegada de “Titonomaquia” (1993), e consolida a nova formação do grupo, agora um quarteto (após a saída do baterista Charles Gavin em 2010). Assim, Paulo Miklos, Tony Bellotto, Branco Mello, Sérgio Britto produzem um som de volta às raízes, acompanhados pelo ótimo baterista Mario Fabre e o produtor Rafael Ramos.

No melhor estilo “Cabeça”, o álbum possui catorze “porradas” e se inicia com “Fardado” (“Você também é explorado, fardado”), que uma atualização de “Polícia”. Já “Cadáver sobre cadáver”, parceria de Miklos com o ex-titã Arnaldo Antunes, trata da violência urbana que tanto assola a sociedade: “Morre quem mereceu e quem não merecia”. Por seu turno, “República dos bananas” critica o fato de todos opinarem sobre tudo nas redes sociais. Outro destaque é a regravação de “Canalha”, de Walter Franco, à la Black Sabbath, combinando com o conceito geral. A brasilidade do grupo aparece na niilista “Baião de dois”, que tem versos de Pixinguinha, Cartola e Noel Rosa. Por tudo isso, “Nheengatu”, não é só o maior trabalho que os Titãs realizaram nos últimos vinte anos, mas também o melhor álbum de rock feito no Brasil recentemente. 

(Texto de Ricardo Salvalaio publicado no caderno AT2, do jornal A Tribuna, no dia 20/09/2014)

Ouça o álbum na íntegra:


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