Aos 71 anos, Paul
McCartney ressurge modernizado no disco ‘New’
LONDRES — Em uma típica tarde londrina, cinzenta e chuvosa, Paul McCartney,
provavelmente o maior artista vivo do planeta e o homem cotado para ser a
atração de encerramento da Copa do Mundo de 2014, deu início à maratona de
entrevistas para promover seu novo trabalho, simplesmente chamado “New”
(“Novo”), o primeiro disco de inéditas em seis anos. Aparentando menos do que
os seus 71 anos e ainda ostentando um olhar jovial, Sir Paul — que passou o dia
anterior gravando um clipe nos lendários estúdios em Abbey Road, onde os
Beatles gravaram praticamente todas as suas canções — chega à sala onde
jornalistas de vários países o aguardam, faz uma piadinha e começa a dar
detalhes sobre o novo trabalho, que será lançado mundialmente no dia 14, e até
sobre alguns aspectos da sua vida pessoal.
Gravado com a colaboração de quatro produtores — Giles Martin
(filho de George Martin, produtor dos Beatles), Ethan Johns (filho de Glyn
Johns, engenheiro de som que trabalhou com Paul nos Beatles e Wings), Mark
Ronson (que gravou com Amy Winehouse) e Paul Epworth (responsável pelo
estrondoso sucesso do álbum “21”, de Adele) —, “New” mostra um McCartney bem
diferente do que lançou “Kisses on the bottom” — uma coleção de clássicos
americanos, em 2012. No novo trabalho, Macca está muito mais “moderno”, embora
tenha preferido usar apenas instrumentos vintage na gravação das canções, num
clima que lembra bastante o seu projeto “The fireman”, que rendeu o ótimo
“Electric arguments” (2008).
— Eu queria ver como era trabalhar com cada um desses
produtores. Quando vi o que eles fazem, eu achei interessante, por razões
diferentes. Paul Epworth, o primeiro com quem trabalhei, gosta muito de
experimentar. Ele tem uma ideia e diz para você: “Por que não tentamos algo
assim (imita o som de uma bateria)?”. Então, fui para o piano, toquei algo parecido com o que
ele sugeriu, e isso acabou se transformando na faixa de abertura do álbum (“Save
us”). Esse é o método dele — contou Paul. — Já quando
trabalhei com Mark Ronson, foi diferente. Ele pegou minhas canções e tentou
fazer com que soassem da melhor maneira possível, o que é um método totalmente
diferente de trabalho em relação ao Epworth, sem tanta improvisação. Ethan
Johns é muito orgânico. Eu disse: “Tenho essa canção chamada ‘Hosanna’, cantei
para ele, e fomos juntos para o estúdio. Quando terminou, perguntei se estava
tudo ok, se os vocais estavam bons. E ele disse: “Perfeito!”. Era basicamente
um take ao vivo. Giles já é interessante por outros motivos. Ele gosta de pegar
uma canção, trabalhar nela, algo no estilo do que o pai dele fazia. É como um
novo George Martin!
“Como qualquer um”
Na canção que dá nome ao disco, Paul diz que
“podemos ser o que quisermos, podemos fazer o que escolhermos”. Mas Paul
McCartney pode fazer o que quiser?
— Sim. Normalmente, as pessoas dizem que você
não pode fazer isso ou aquilo por ser famoso, mas eu consigo — diz. — Vou ao
cinema, como qualquer um. Adoro ver um filme novo. Eu sei que algumas pessoas
que são tão famosas quanto eu não podem fazer isso, mas eu adoro ir ao cinema
ou fazer compras, ir até a academia. As pessoas não me importunam. E, por outro
lado, artisticamente eu tenho muita liberdade. O que é uma sorte. Então, a
resposta é sim.
Mas, se Paul tenta levar uma vida normal,
alguns aspectos da fama ainda o incomodam. E, como detentor de uma história
musical riquíssima, ele ainda se preocupa em dar a sua versão dos fatos. Na
balada “Early days”, por exemplo, ele deixa claro que fica incomodado quando as
pessoas tomam por verdade histórias que não aconteceram.
— A canção é na
maior parte feita de lembranças sobre John (Lennon) e
eu. Sou eu me lembrando do nosso início, andando pelas ruas de Liverpool com
violões nos ombros. E a canção diz “You can’t take it away from me” (você não pode tirar isso de mim). São minhas lembranças. Alguns jovens
jornalistas às vezes dizem: “Isso foi assim”, e eu respondo: “Não, você não
estava lá”. Há momentos em que isso se torna um problema, porque as pessoas
distorcem a realidade — afirma. — Para mim, por exemplo, na época dos Beatles
ou Wings, eu trabalhava com um grupo de pessoas, e nós éramos iguais. Não
importava quem tinha feito algo ou de quem foi tal ideia. Às vezes, a gente nem
lembra quem fez o quê. Isso não importa. Mas, quando chega ao estágio de fazer
uma análise, e escritores precisam fazer isso, senão provavelmente não teriam
sobre o que escrever, isso se complica. Por exemplo, em um dos livros que eu li
dizia: “Paul fez essa canção em resposta a John na canção tal”. E eu pensei:
“Eu não fiz! Apenas escrevi. Não tem nada a ver com John ou outra pessoa”. É
disso que falo, às vezes a realidade é distorcida.
Tristeza
como combustível
Outra revelação é a de que o sempre
sorridente e otimista Paul McCartney também sabe usar a tristeza como
combustível para sua inspiração:
— É bom ficar triste. Seria estúpido viver
somente rindo. Quando você compõe, tristeza é sempre um bom elemento, mas
também é bom poder rir e fazer piada sobre esses momentos. Às vezes, é preciso
transformar dor em risada. Uma das coisas boas sobre os Beatles, Wings e sobre
a minha banda atual é que nós rimos muito. Nós estamos rindo o tempo todo,
mesmo quando passamos por algum momento difícil. Nem sempre as coisas são
fáceis. É a condição humana.
“New” chega como um apanhado de tudo o que
Paul já fez em sua carreira, já que é difícil ser totalmente novo para quem já
gravou tantas coisas em tantos estilos. Em determinado momento, o músico — que,
pela primeira vez, ontem, respondeu a perguntas de fãs via Twitter — parece
ainda muito preocupado com o futuro e com o que ainda tem para produzir, e não
apenas com o passado glorioso:
— Uso o passado e as emoções que senti
frequentemente na minha música, mas não acho que seja o único. Acho que muita
gente faz isso, e é bom. É claro que há canções das quais acabo me esquecendo,
e aí fica perigoso a gente acabar se repetindo. Nessas horas, o jeito é confiar
nos amigos e perguntar se algo lhes soa familiar. De vez em quando, um se vira
para você e diz: “Adorei isso, mas você já usou na canção tal...”. Não tem como
ser diferente.
Mas o passado não é o único alvo de Paul,
assim como a aposentadoria não faz parte de seus planos. Com uma agenda que
ainda inclui mais entrevistas, festas de audição das 12 faixas do disco e uma
apresentação em um novo programa da BBC, o que esperar de Paul McCartney no
futuro?
— Mais música! Eu tinha mais canções do que
precisava para este álbum, e quando tiver tempo para revisitar algumas dessas
músicas que eu não gravei, vamos ter uma outra safra de novas canções — prevê
Paul, que deixa claro que está longe de dizer adeus aos palcos ou às gravações.
FONTE: O GLOBO
Abaixo, confira, 3 novas canções do mestre:
Nenhum comentário:
Postar um comentário