Sandro Bahiense é professor, bibliotecário e amante das coisas que
envolvam escrita. Lançou em 2008, em parceria de Ricardo Salvalaio e de mais 7
colegas poetas, a coletânia de poesias "8 Vezes Poeta", trabalho em
que pôde expor um pouco de seus sentimentos e arte. Ficou conhecido entre os
colegas da UFES por fazer uma crônica para cada um deles. Além de crônica e
poesia, Sandro também escreve artigos de opinião, contos e máximas. Tais
trabalhos podem ser vistos em seu próprio blog cujo endereço é http://sandrobahiense.blogspot.com/.
Sandro trabalha também, claro, neste blog como um dos colunistas. Confira,
abaixo, o poema "Conversa":
Conversa
_ Oi.
_ Oi.
_ Eu estou onde penso que
estou?
_ Sim. Está sim.
_ Caraca... Ei, peraê,
você é...
_ Sim. Sou.
_ Meu De... Como eu vim
parar aqui?
_ Não se preocupe com esse
tipo de coisa.
_ Nossa me sinto tão bem.
_ Sim. E essa é a ideia.
_ Como eu vim parar aqui?
Quer dizer, eu já perguntei isso, mas, tipo, não sei se você sabe, quer dizer,
você deve saber né, que eu, sendo bem honesto, tive minhas falhazinhas.
_ Na sua pergunta você já
respondeu. O tempo todo você foi honesto consigo e, por consequência, comigo.
_ Mas é que... Eu tipo não
te cultuei sabe.
_ Sei. E entendo. Muitos
me cultuam, muitos não. Muitos que dizem me cultuar não me cultuam e
vice-versa. O que eu quero é que vocês sejam sinceros. O melhor caminho pra
chegar até aqui é através da sinceridade com vocês mesmos.
_ Entendo... Putz, e
mamãe, papai e Larissa...? Eles devem estar...
_ Não. Eles estão bem.
Eles foram geridos para passar por esse tipo de situação.
_ Mas... Porr... Poxa eu
só tinha 31 anos.
_ Não se apegue a datas,
números e coisas do tipo. Todos tem o mesmo ciclo. É igual. Para alguns o ciclo
passa mais rápido, para outros mais devagar. Simples assim.
_ E meu, como você disse
mesmo? Ciclo. Acabou? Tipo, eu não vou ter uma segunda chance nem nada.
_ Não existem chances. Isso
nunca foi um jogo, porque todos sempre ganham. Não existem fases. Vocês
aparecem e ficam, pra sempre.
_ Que complexo.
_ Nem tanto. Quando alguém
nasce ele aparece para ficar para sempre. É um ser infinito.
_ Você faz tudo parecer
tão simples.
_ E é. Vocês que insistem
em complicar as coisas.
_ Sei lá, acho que você
devia, tipo, interceder, sei lá. Posso te chamar de você?
_ Pode, pode sim. Eu
intercedo. O tempo todo. Só que vocês insistem em aparições humanas, palpáveis.
Minha intercessão está nas pequenas coisas, principalmente nas que se passam
dentro de vocês.
_ Dentro de nós? E o que
que você nos agrega?
_ O Bem.
_ Hum... O bem. Não é o
que parece.
_ Por quê?
_ E esse monte de guerras,
assassinatos, estupros. São os fins dos tempos.
_ Não existe tempo,
portanto nem fim, nem começo. Tudo começou pelo fim e renasce a cada instante.
Eu levo o bem a vocês, mas cabe a vocês decidir se o utilizarão ou não.
_ Por isso que eu digo se
você intercedesse...
_ E quebrar aquilo de mais
valioso que foi criado. Que é o “não-saber”. Vocês tiveram a maior das
virtudes, a de decidir. E decidem. Coisas boas e ruins. Mas tudo partindo e
findando por vocês.
_ Tá. A gente parece
fantoche.
_ Não, pelo contrário. Não
decido o que vocês fazem. E, se intercedo, é através do abstrato. Não é nada
que se possa ver ou tocar, mas é muito poderoso.
_ Você tá ligado que...
Quer dizer. O senhor sabe que muita gente tem “duvidados” de tú e muitos
acreditam que nem existas.
_ O que que é isso?
“Senhor”, “duvidados”, “existas”... Pode falar comigo como você sempre falou.
_ Eu nunca falei com você
eu acho.
_ Falou sim, várias vezes.
Com seu olhar, com seu sorriso. Com a felicidade exposta no rosto, com a mão
que afagou quem precisava. Com a mesma mão pedindo auxilio... O tempo todo
dialogavas comigo.
_ Hum... É verdade.
_ E quanto às pessoas
duvidarem de mim... É o contrário. Quanto mais duvidam, mais acreditam. Quanto
mais dizem que não existe, mais acreditam na existência. Não provam a
existência e, por fim, ficam aliviados por não provarem.
_ E as nossas vidas? Por
que eu nasci pobre? Não gostava de pegar ônibus cheio todo dia de manhã. Você
sabia disso. Vai me dizer que foi opção minha também?
_ Não, claro que não foi
opção tua. Foi sorte.
_ Ah tá. Sorte. Conta
outra.
_ O dedo do imponderável
está nas coisas que não se pode ver, nas outras é simplesmente sorte. Você
poderia ter nascido rico, pobre... Eu não interferi. Quando alguém ganha na
loteria, ou se salva da algum acidente grave, é sorte, e não intervenção minha.
_ Mas nosso destino não
está escrito?
_ Sim está.
_ Então?
_ Sim, mas os escritores
são vocês. É como se fosse um círculo que começa pelo final e se reinventa a
cada segundo.
_ Mas você sabe o final?
_ Sei, pois o final foi
aquilo que já passou.
_ Ah cara. Deixa pra lá.
_ Não. É simples. Vocês
não tem fim. Então o fim de vocês é o inicio.
_ De trás pra frente?
_ É.
_ Ah tá. Entendi. E daí as
coisas que vão acontecendo são na sorte e na nossa batalha?
_ Exatamente.
_ E você intercede nos
auxiliando em nossas atitudes, tipo, dando coragem, perseverança, é essa a
palavra mesmo, perseverança?
_ Sim. É perseverança
mesmo. E é exatamente isso que você está concluindo.
_ Então não tem morte? É
isso?
_ Sim.
_ Nossa realmente você é
muito bom com a gente.
_ E vocês são muito bons
comigo, tenha certeza.
_ Sabe o que é mais
engraçado? Aquele ditado que diz que a gente vai de uma para melhor é verdade.
Mas quem a gente deixa fica numa dor danada. E aí como faz?
_ Faz como você mesmo
disse. Na sorte, na batalha... E contando sempre comigo.
_ Nossa realmente você é
muito bom com a gente.
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