“Existem sutilezas estéreis, há também bobagens fecundas” - (René Descartes)
Minha cidade é uma ilha, é dela que extraímos nossa realidade e a narrativa que conduz e confunde sonho, fantasia e pesadelo. O prisma dessa trindade na terra dos botocudos forma uma liga feita de sombras e luzes, onde as produções da “sétima” anualmente se movimentam. Esse amalgama de superfície cria aspectos grotescos no vir a ser que ainda perdura. Apesar de combatido, esse ranço fez escola e formou uma geração. A postura branca utilizada por “curadores sensores” a frente do VCV, apelidado hoje de “festival de Vitória” busca desconstruir uma ordem existente que se mantém e faz cinema de forma genuinamente artística e original. Esse ilhéus, ativistas da imagem local vivem há décadas entre o desafio e o combate, por isso mesmo escolheram viver aqui e, acreditar que é possível criar um gênero de situação audiovisual permanente em nossa cidade diferente do atual modelo que ao longo dos anos vem se esvaziando.
Apesar da represália que de forma velada persiste, continuamos à aprofundar as origens do fazer audiovisual dessa ilha-cidade-capital e, jogar luz sobre o comportamento dos déspotas e arrivistas que determinam onde e quando os tapa-olhos e a mordaça serão aplicados. Esses senhores e senhoras transvertidos de proprietários e curadores do Festival de Cinema de Vitória não percebem que o que nos ronda esta muito além do alcance crítico de qualquer denuncia artística - o fato é que eles ignoram o mal do mundo que tem que ser esfregado a cada dia em suas caras e dos espectadores para que não esqueçam o horror social e político que nos assola. Esses senhores e senhoras confundem o nosso ativismo artístico e cultural, com o bando de ruminantes que os cercam e acenam positivamente, festivamente, fortalecidos com o ácido da intolerância e seus temas inócuos. A mordaça na nossa linguagem visual traz em si um paradoxo – o medo e, ao mesmo tempo, o desejo de ser vista. Para esses “sensores”, é como se houvesse algo de fantástico contido na revelação que eles não vêem e não deixam ver, pois, lá está precisamente o intimidante silêncio visual gritando aos seus olhos e ouvidos.
O cinema do ES, com raras exceções, nivela tudo por baixo, sem a preocupação se acrescentam algo de válido e verdadeiro ao conhecimento.
Ao tomar o exterior de cada pratica pelo seu interior, fica claro que essas pessoas assumem comportamentos duvidosos. Caríssimos, o exercício imagético vai além daquele que ignora que é preciso impelir a inteligência até o ponto de se ter a ousadia de parecer tolo. No Brasil, o sonho ou pesadelo fílmico é atividade de exceção, Vitória não foge a regra. O cineasta engajado que vive para e do seu oficio, torna-se extremista enquanto realidade, pois no mundo parte da história é transmitida pela imagem, outra pela palavra. Caro leitor, remexa nos arquivos de seu pensamento, é inquietante, mas vale à pena, pois sempre vem à tona resíduos mentais em forma de lembranças já vivenciadas ou históricas que nos remetem à farsa, à ignorância e por fim à truculência enquanto realidade oferecida.
Marcos Veronese é Diretor de
Cinema e Jornalista.
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