domingo, 11 de novembro de 2012

UMA PARCERIA CHEIA DE BOSSA


Fernanda Takai em “Onde brilhem os olhos seus” (2007), um disco contendo somente canções gravadas por Nara Leão, provou que era muito mais do uma cantora da banda de pop-rock Pato Fu. Na obra, ela soou cool, criativa, versátil e com uma voz ainda mais encantadora e doce. Agora, Takai lança ao lado de Andy Summers, ex-Police, o CD “Fundamental”, que contém onze músicas inéditas. As canções foram compostas por Summers especialmente para a voz de Fernanda, e cinco delas ganharam versões em português feitas por ela, seu marido, John Ulhoa, e Zélia Duncan. A ideia do disco em parceria partiu de Andy, que ficou encantado com o timbre sutil da voz de Fernanda após assistir ao documentário “United Kingdom Of Ipanema” - que ele estrela junto do músico Roberto Menescal, e no qual a cantora brasileira participa na música “Insensatez”. O inglês Andy Summers, considerado o 85º melhor guitarrista de todos os tempos pela revista norte-americana “Rolling Stone”, se encantou: “A voz dela tem luz, é diferente das outras cantoras”, revela. Ao final, eles selecionaram 11 de 25 canções. Além de tocar guitarra, Summers assina também os arranjos e a produção do disco.

“Orfeu Negro”

A obra da dupla é toda pautada pela Bossa Nova. Segundo Andy Summers, o gênero está em seu imaginário desde seus 16 anos, quando assistiu ao filme “Orfeu Negro”. Além da Bossa, Summers também tem influência do jazz e seus trabalhos solo trazem essa forte inclinação para toques de música erudita e World Music. Charles Mingus, Wayne Shorter e Thelonius Monk são algumas de suas influências. Por outro lado, são inesquecíveis os solos e dedilhados em clássicos do pop como “Roxanne” ou “Message In A Bottle”, canções do The Police que são referências para várias gerações. Em “Fundamental”, mesmo a Bossa Nova perpassando o álbum como um todo, também há espaço para outros gêneros, como jazz-samba, baião, pop, rock. No entanto, a Bossa serve como base de versos líricos e de timbres de guitarras e teclados (tocados por Summers) que em tudo remete à densidade pop britânica que o guitarrista ajudou a construir. A percussão acústica do brasileiro Marcos Suzano e o suingue mexicano do experiente Abraham Laboriel (baixo) também ajudam a criar um clima muito original. Algumas faixas do disco também contam com as guitarras do marido e eterno parceiro de Takai, John Ulhoa.

As canções

“Fundamental”, canção homônima, abre o disco e tem toques bossa-novistas à la Menescal. A letra romântica, como em “Wave” (Tom Jobim), prega que não devemos ser sozinhos: “o nosso amor é fundamental”.  Já “Smile and blue sky me” lembra o lirismo e os vocais de Paul McCartney. Na verdade, a tônica das letras do disco é o amor e suas relações. O soft-baião “Pra não esquecer” (I remember) também segue essa linha romântica ao tratar daqueles amores perdidos e não correspondidos (típicos das letras de Bossa). A batida perfeita de Marcos Suzano, a voz doce de Takai e a participação de Zélia Duncan o transformam num dos melhores momentos do CD. “Sorte no amor” (Music in the darkness) tem forte influência da MPB. O lirismo aqui presente revela que mesmo numa era superficial como a nossa, em que todos escondem seus sentimentos e ninguém é verdadeiro, o amor deve existir: “Numa doce entrega tudo é mais real/ Bate um coração de paixão/ O amor ideal. [...] Indo pro futuro/ Não há matinê, mesmo no escuro/ A força do amor/ Brilha em você”. Ademais, “Chuva no deserto” (Teardrops in the sea) tem forte influência latina, com ótima guitarra no estilo Santana. Destaque também para os teclados de Summers e para os belos versos: “Por que eu amo tanto?/ Isso é tão estranho, louco/ Pode ser só devaneio/ Sonho assim o dia inteiro/ No amor, metade é ilusão”. “No mesmo lugar” (Here i am again), por seu turno, é uma bossa por excelência. Tanto tem letra quanto em melodia. Talvez seja a faixa que mais resuma “Fundamental”. “I don’t love you” é a faixa mais pop-rock da obra, ela é a que mais tem uma sonoridade oitentista e, por isso mesmo, lembra até o grupo Pato Fu. A letra elenca as contradições do amor: “Eu não te quero, mas te amo. Deixe-me agora, mas sempre esteja aqui, eternamente”. “Human Kind” é um pequeno e lindo blue. A voz sutil de Fernanda Takai remete àquele clima jazzístico dos anos 40 e 50.
Por tudo isso, “Fundamental” é um disco no melhor estilo “um banquinho, um violão” e essencial para quem também acha que o amor é fundamental.

(Texto de Ricardo Salvalaio publicado no Caderno Pensar, do jornal A Gazeta, no dia 10/11/2012)





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