sexta-feira, 27 de abril de 2012

"LICENÇA CRÔNICA": CARLOS ALEXANDRE DA SILVA ROCHA


Carlos Alexandre da Silva Rocha nasceu em Vitória-ES em 1988. Escreve desde os treze anos de idade e tem como influências Drummond e os escritores simbolistas. Em 2008, lançou, pela Lei Rubem Braga, o livro de poemas “Um homem na sombra”, que aparentemente se coloca aos olhos do leitor como algo simples. Entretanto, como o livro versa sobre as angústias humanas, ele torna-se não tão fácil de ser encarado. Carlos Alexandre é formado em Letras-Português pela UFES e escreve no Blog Pierrô crônico (www.pierrocronico.blogspot.com). Confira, abaixo, a crônica “É duro...”:


É DURO...

Meus ossos doem nas noites frias. É duro ser velha, nesses tempos idos (voltosos? Acho que não!). Quando se tem longas idades, tudo vira outro tempo, apesar de que no meu tempo era tempo de outrem que já virou pó e lápide. Agora vivo assim, a caminhar marcando os passos para não me cansar. Semana passada tive que tingir meus cabelos. Margarida de las Calles, a Magá, foi presa. Éramos da gang das velhinhas, na verdade fomos um trio.

Tingi meus cabelos de vermelho, para me disfarçar, apesar de que mulher não envelhece, fica loira! Eu, por ser uma anciã original, pinto as minhas madeixas de ruivo. Sou uma mulher de fogos.

Meu nome é Carlota (não a Joaquina, não teria a energia de pular no túrgido como ela, já não tenho tanta empolgação! Ai que saudade dos meus vinte...). Entrei nessa vida por falta de opção, pensei em trabalhar como velha-do-fado, mas quem iria querer o meu ser viço? Para o rendez-vous eu não sirvo...

Pobre de mim! Tive que ir para o crime. Fui para ele, mas não por paixão. São as contas, a farmácia, por exemplo, está um absurdo o Melanazona, o Vedafril, o Afanoptopril, são tantos il e onas que já perdi as contas. E a aposentadoria... Continua aquela coisa mirradinha feito meu velho quando tentamos sacudir as pelancas. É... Nem para o azulzinho estávamos tendo... O doce elixir da juventude!

Furtei, admito! Não escondo o meu pecado. Coitada da Magá, deve estar comendo o pão que o diabo amassou com a bunda. O que se pode fazer? Neste país, velho e escritor não têm vez... Fui escritora, desisti quando descobri que escritor é como animal raro, as pessoas só o querem empalhado na estante.

Agora vivo aqui, escondida no asilo “Velho Feliz”. A felicidade aqui é estranha! Todo dia levamos alguns pontapés, é o mal de viver em instituições irregulares. Deveriam prender aqui certos vereadores que aumentam seus salários exorbitantemente. Vou tomar meu banho. Uma ducha para tirar as caracas da semana. A mulher que cuida da gente já está segurando a mangueira, aquela grossa com que os bombeiros apagam o fogo. Pena que sou uma mulher de fogos controlados há algum tempo...

Um comentário: