Jackson Libardi é estudante de Literatura e membro da CONFRARIA DOS BARDOS. Confira, abaixo, o conto “Um caso dúbil”:
UM CASO DÚBIL
O edifício é o que fica na esquina da Francisco Xavier com a Dom Pedro ll, e que está em oposição a igreja de São Miguel no centro da cidade. Um imóvel no estilo clássico e que realmente se parece mais com um simples prédio abandonado, apesar da suntuosidade arquitetônica super conservada; mas, que para uns poucos, condomínio nunca foi. A minoria que com o tempo por testemunha diz ser detentora da verdade.
Lá funcionou uma loja maçônica até meados da década de oitenta , segundo o senhor Ladislau Pereira, guardião-mor destes arcanos e do necrotério da Santa Casa de Misericórdia. Quem confirma que naquele local funcionava e fora fundada mesmo uma loja maçônica são os moradores mais antigos; em contrapartida da garotada que ─ prescindindo de métodos da ciência histórica e da natureza do tempo ─ afirmam ser simplesmente casa abandonada.
Foi a mais importante loja do Estado, reunindo pessoas ilustres do setor público e privado. – Disse-me certa vez o senhor Ladislau, ostentando cultura na linguagem. – As reuniões eram sempre às segundas-feiras. E as ruas avolumavam-se de carros, a maioria de luxo. – acrescentou gesticulando com reflexos de convicção.
Naquela ocasião, o Senhor Ladislau me contou diversas coisas muito curiosas, entres as quais estão estas que de tão atuais me motivaram a partilhá-las. Contou-me que os exercícios na loja cessaram por conta de uma tragédia. Que todos os membros, com exceção de três incluindo o grão-mestre, morreram no acidente do Boeing 613 em 1984, quando iam à Inglaterra por ocasião de uma convenção. Que por isso as reuniões naquele lugar haviam se extinguido. Disse também que três anos depois do acidente pelo menos uma vez as luzes da loja foram vistas acesas numa madrugada. Também afirmou saber por fonte confiável que no chão da sala principal foi enterrado um baú com alguns objetos de ouro, como um punhal, um pentagrama, um castiçal; e outras coisas mais que envolvia mistério e valor. Entretanto, uma praga que remete à época dos faraós havia sido rogada para qualquer um que ousasse ultrapassar os umbrais da sala.
Eu o ouvi atentamente naquela tarde, uma tarde de sexta-feira, na praça do bairro, quando encontrou-me lendo um livro sentado aos pés da estátua do ex-presidente Getulio Vargas. Mas não havia em mim a curiosidade de lhe perguntar por intermédio de quem soubera tantos segredos; até que num outro encontro…
Esses comentários se ouve até hoje na Cidade Alta, entre os mais antigos. Você nunca tinha ouvido? Como surgiu… sabe-se lá! Mas quem me confirmou foi o Dr. Sampaio, diretor do hospital que trabalho, que inclusive é um dos três que não estavam no avião no dia do acidente. “Isso é coisa que não se deve contar” ─ disse o Doutor ─ “mas como já está na boca do povo…”
Já que a história era tão comum na boca do povo e só eu que não conhecia até então, decidi ouvi-la por outras pessoas. E constatei que de fato é sabida da maioria dos residentes antigos. Acabei descobrindo também, que o senhor Ladislau é tido para alguns como um velho fofoqueiro, e para outros como mentiroso, e para um terceiro grupo como fofoqueiro e mentiroso; que ele inventou essa história de baú, de maldição; antes dele ser convidado a se empregar no hospital , o que se comentava era que o Dr. Isaac e seus genros, o Dr. Sampaio e o Delegado Henrique de Melo, haviam ficado com tudo que havia de valor na loja. E que até eram responsáveis pelo acidente.
Passei algum tempo, sem muita pretensão, senão um pouco de curiosidade, a interrogar algumas pessoas, a indagar e a questionar outras. Mas depois conclui que os fatos eram contraditórios e inconsistentes, e que também meu ânimo era frouxo; dando assim, fim a minha fugaz vida de detetive da Scotland Yard Capixaba. Mas não vou deixar de admitir que essa aventura me suscitou ótimas hipóteses.
Parece mesmo que o Senhor Ladislau foi comprado pela família do Dr. Isaac para disseminar a história da maldição; parece. Afinal de contas se eles ficaram mesmo com os objetos de valor, se é que havia objetos de valor, ficaram indevidamente; portanto, passivos de serem acusados de roubo e de terem inventado as histórias supersticiosas. Outra coisa também é fato: que a família do Dr. Isaac Amir, grão-mestre de então, está entre as mais ricas do nosso Estado.
Bardo!
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