Juca Magalhães é músico, escritor e ex-integrante
do grupo “Pó de Anjo”. É um
dos mais requisitados mestre de cerimônias do Estado, com atuação em eventos
públicos e privados. Autor do blog a “Letra Elektrônica” e textos publicados no
Caderno Pensar, do Jornal A Gazeta. É autor dos livros “O Livro do Pó” e “Da
Capo - De Volta às Origens da Orquestra Filarmônica do Espírito Santo”.
Magalhães também trabalha na
divulgação e desenvolvimento de projetos voltados para educação e performance
de música, sobretudo canto coral, clássica e popular. Confira, abaixo, a
crônica “Com quem será?”:
COM
QUEM SERÁ?
Sexta de noite, sai pra jantar com
minha garota e uma amiga. Mulheres bonitas, sorridentes e relaxadas, felizes
por poder sentar em algum lugar para atualizar as notícias e jogar conversa
fora. Enquanto caminhávamos pela rua, por duas vezes, percebi uma coisa que
aconteceu de maneira bem semelhante. Dois caras sentados em barzinhos por que
passamos devoraram as duas com olhares que beiravam o atentado ao pudor. Não
jogaram nenhuma piadinha, talvez porque me viram junto, mas isso não os impediu
de devorar as meninas com os olhos.
Havia uma espécie de ódio naquele olhar,
mas não era a frustração que dá no leão quando a gazela escapa. Era uma espécie
de raiva pela evidente (e inconsciente) obrigação de ser homem. Sobretudo,
havia o outro. Aquele olhar guloso era mais para o parceiro do que para as
bonitas que desfilavam ante seus olhos impotentes, para mostrar para o
companheiro de copo que ele é um homem. Depois que a presa passar, vão sorrir
em cumplicidade despertando o sentimento de pertencimento à categoria dos
machos. É, na verdade, a única coisa que podem fazer com relação à sexualidade
reprimida da qual nem se dão conta.
Existe a ideia, bastante difundida, de
que as mulheres se arrumam e se esmeram em cabelos e vestidos para impressionar
as outras mulheres. “E tentem mim (sic) superar!” Frase bastante comum em
declarações espontâneas no “Livro das caras”. Já os homens penam com a
responsabilidade de conquistar essas mulheres, afinal, é uma coisa muito chata
e boboca a obrigação que o homem tem de provar que é homem. E não é para as
mulheres: é para os outros homens. Já não basta o corpo recoberto de pelos e a
voz grave como a buzina de um navio, precisam mostrar mais o quê? Precisam das
mulheres.
“E disse o SENHOR Deus: Não é bom que o
homem esteja só; far-lhe-ei uma ajudadora idônea para ele” (Gênesis 2:18).
O homem precisa da mulher social, sem
ela o cenário nunca está completo e as cobranças são várias. Um homem sozinho
causa aquela estranheza da qual muitos têm horror: a fragilidade do feminino.
Mesmo muitos homossexuais não aceitam, nem tornam público seu afeto por outros
homens. A possibilidade de amar ao outro assombra, então alguns se caricaturam
em machos, são o avesso dos travestis. Saem aos bandos constrangendo garotas e
arrumando pancadarias. Por que será? Aliás, a cobrança já começa nos
aniversários: com quem será? Eis a questão que persegue a todos desde a pequena
infância...
E o que dizer da ideologia no
cancioneiro do nosso Brasil machista? “O homem de moral levanta, sacode a
poeira e dá a volta por cima”; “Homem que é homem não chora”; “Todo homem que
sabe o que quer pega o pau pra bater na mulher” (versão muito popular de uma
daquelas canções do Roberto).
Então toda a violência se origina na
repressão sexual? Eu sei lá se não. Mas essa é uma verdade que ninguém vai ver
o Datena vociferar valentemente em seu programa na televisão. O ódio existe não
pela falta de amor, existe porque a sociedade nos obriga a amar, mesmo que não
se queira. E essa é uma forma de violência assumida como coisa natural. Daí é
possível inferir o tamanho do equívoco daqueles que ao invés de buscar a
compreensão, acham que o certo é endurecer a repressão. E ao pregar o amor,
incitam ainda mais a violência que dizem querer evitar.
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