Leandro Freitas Menezes é licenciado em Língua Portuguesa e Literatura de Língua Portuguesa pela UFES. Estudante de Pós-Graduação em Língua Portuguesa e Literatura Brasileira / Línguistica Aplicada na Educação pela Universidade Candido Mendes. É Professor/ consultor textual e tem textos no site “Recanto das Letras” (www.recantodasletras.com.br/autores/menezeslf). Confira, abaixo, o conto “Sempre tem um jeitinho”:
SEMPRE TEM UM JEITINHO
Essa história, não sei se é verdadeira ou não, mas é certo que nela há um fundo de verdade, como há em todos nós.
Por volta de 1925, numa cidade interiorana de Minas Gerais, havia um fazendeiro muito rico, era o coroné daquele lugar, homem temido e respeitado por todos. Esse homem tinha um filho, o qual não morava com ele, porque foi mandado para São Paulo a fim de estudar direito. Pouco responsável que era, aproveitava-se de todo o dinheiro que o pai lhe mandava para gastar com farras e mulheres. Passou anos fazendo assim. Mas a verdade é que nem tudo dura para sempre.
Um dia o coroné, homem muito respeitado, entrou numa questão de terras. Não quis resolver com a própria força, contudo, decidiu chamar o orgulho da família para defendê-lo no tribunal. Então, de sua cidade, mandou um recado para seu filho, o grande advogado. Imagine qual foi a reação dele ao receber o informado de que teria que defender o pai no tribunal da comarca de sua cidade natal, com todos as pessoas de lá presentes. Sim, certamente aquilo não seria um julgamento, mas um espetáculo. O comentário seria geral: “Óh!!!! O Doutor fulano de Tal, filho do coroné vai vir dia tal para defender a honra de seu pai...”
Os dias se passaram e o jovem boêmio não sabia o quê fazer, pensou mil coisas e nada. Perguntava a si mesmo: “Como sair dessa enrascada?” Porém, a solução não vinha. Então, próximo do dia tão esperado por todos, o qual o rapaz procurava dele fugir, o pai lhe mandou a condução. Era uma charrete bem aparelhada e preparada para a viagem. Os cocheiros o cumprimentaram: - Bom dia Doutor Fulano. Ele sem graça e pensativo os saldou também. E assim foi, mas a incógnita estava na sua cabeça o tempo todo. Não poderia decepcionar a ninguém, principalmente o pai. Pensou muito ao longo da viagem.
Passava-lhe focos das coisas que via no caminho, e pensou: “Falar como advogado não deve ser coisa fácil...”. Olhou para um coqueiro muito alto e veio-lhe a mente: “É de automéia”; viu também o côco pendurado e disse: “É de redondeia”. Em outro trecho mais à frente observou um homem amassando um cavalo selvagem que relutava em aceitar o adestrador em seu lombo, mas ele não desistia e procurava a todo o custo dominar o animal. O falso advogado olhando aquela cena espetacular pensou: “É de grande paciência”. Caminhando, chegaram a um local que havia uma travessia, como uma ponte: novamente ele pensou: “É de travassante”. Chegando a propriedade após dias de viagem o rapaz viu muitas cavalgaduras que corriam e empinavam para todo lado dentro dos currais. Então, mais uma vez ele pensou: “É de cavalcante e empinante”.
Chegaram finalmente. O jovem falso advogado foi recebido por todos com muitas honras. Foi como havia pensado de início. A cidade todo esperava um grande evento. Não era somente um simples julgamento de questão. Assim, por toda essa situação ele se portou sem graça, mas os pensamentos estavam em alta em sua mente: “Como vai ser”? “O que vou dizer”?
Na hora esperada por todos, menos por ele, foram para o tribunal da cidade. Estava lotado fora e dentro. Era uma grande expectativa. O jovem foi como uma ovelha para o matadouro. Muito preocupado, muito tenso porque sua vida de mordomias estava para acabar de maneira trágica. Mas os pensamentos estavam em alta em sua mente, muitos focos e visualizações. A final, a viagem foi longa. Teve muito tempo para pensar.
Foi aberta a sessão e lida a pauta do dia. E a situação ia ficando, para o rapaz, cada vez mais tensa. O juiz chamou o advogado do fazendeiro oponente que falou até a boca escumar. Após, foi a vez do falsário. Quando o juiz o chamou todos fizeram silêncio, uma reverência. Foi como se um deus estivesse entre eles. Então o jovem se dirigiu à frente. Olhou para todos e engoliu seco. Olhou para o juiz que lhe disse: - “Então doutor Fulano de Tal, o quê que o senhor tem a dizer sobre essa questã...”? O silêncio continuava na sessão. Ninguém ousava a levantar a voz. A expectativa era grande, mas o jovem continuava a engolir seco.
Até que então deu vazão aos pensamentos e, em um lance instantâneo de sorte decidiu usar toda a expectativa do povo ao seu favor, a final, linguagem de advogado não é fácil, pensou mais uma vez ele. Tudo isso levou um milionésimo de segundo. Então discursou o rapaz dizendo de súbito: “É de automéia e é de redondeia. É de grande paciência. É de travessante, é de Cavalcante e empinante...”. Todos ficaram parados e pasmos sem dizer nem uma palavra. Olhavam-se uns para os outros. A verdade é que ninguém entendeu os significados das ditas palavras. Mas também não era para entender, a final de contas, de um advogado do porte que esperavam não poderia ser diferente.
Além, disso ninguém se ousaria a perguntar o que significava, nem mesmo o juiz. Tanto que, o silêncio foi quebrado com a batida do martelo usado por ele dando causa ganha para o coroné. Fizeram uma grande festa para comemorar e o rapaz sortudo ficou aliviado por não perder sua gorda mesada.
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