Andra
Valladares reside na cidade de Vila Velha/ES, exerce a profissão de advogada e
atua no cenário cultural como cantora/compositora e poeta/escritora. Publicou
poemas e textos em aproximadamente 30 antologias literárias. Em janeiro desse
ano, lançou o CD "Andra Valladares", seu primeiro trabalho musical
autoral. A obra tem patrocínio da Lei Vila Velha Cultura e Arte e Prefeitura
Municipal de Vila Velha. Andra também é integrante do grupo lítero-musical
"Vozes da Vila". Membro e atual presidente da Academia de Letras
Humberto de Campos (Vila Velha/ES). Confira, abaixo, a crônica “Ócio criativo:
ÓCIO CRIATIVO
"Casas entre bananeiras
mulheres entre laranjeiras
pomar amor cantar.
Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.
Devagar... as janelas olham.
Eta vida besta, meu Deus."
(Cidadezinha Qualquer - C.
Drummond de Andrade)
O artista não precisa apenas de "inspiração e
transpiração" para criar, também é de vital importância um tempo para o
ócio, o sossego.
A mente descansada entra numa vibração diferente e torna-se um
ambiente fértil para a criatividade, as ideias fluem como água de nascente:
límpidas, frescas e serenas...
Às vezes o sono não é suficiente para relaxar, o stress começa
cedo, com o toque do despertador. Nesses momentos, o paraíso seria arrumar as
malas e seguir para um lugar afastado, bem no meio do mato.
Ao invés do odor de "dióxido de carbono", o aroma das
flores, do capim e da terra molhada... No lugar do pó de minério, a poeira da
estrada... O som dos passarinhos e insetos substituindo o monótono ruído dos
automóveis com suas buzinas irritantes.
Simplesmente... Beber água fresca direto da bica, andar de pé no
chão, respirar fundo e sentir o verde invadindo os pulmões. Sentar debaixo de
uma árvore no final da tarde e ficar cismando ao som dos grilos, tendo como
única preocupação as matizes de cores do ocaso...
Assistir o espetáculo da neblina descendo a montanha e invadindo a
casa, como já presenciei certa vez. Essa imagem ainda é vívida em minha memória
como um dos mais belos registros que meus sentidos já captaram, apesar de ter
ocorrido há vinte anos.
Na hora do lanche, o café da roça, torrado na hora, acompanhado de
um bolo simples ou mandioca cozida bem quentinha. À noite, curtir o friozinho e
a paz num passeio para apreciar o luzir dos pirilampos na mata, com os ouvidos
atentos aos inúmeros sons emitidos pelos animais e insetos noturnos.
Acender uma fogueira e reunir a família para contar causos,
apreciar a empolgação das crianças com o crepitar do fogo, assar batata na
brasa, tomar chá de capim cidreira colhido no quintal, para finamente dormir o
sono dos justos e deixar o inconsciente processar através dos sonhos toda a
riqueza de momentos vivenciados plenamente e eternizados no tempo...
Como me faz falta essa vivência e o contato com a natureza com sua
abundância de imagens, sons, cheiros, sabores, texturas... Sem isso me sinto
pobre, exaurida, oprimida e com vontade de “sumir do mapa”!
Privilegiado é quem pode fugir da cidade nos feriados e finais de
semana para conectar-se com essa rica simplicidade, permitindo-se vivenciar o
poema de Drummond e deixar a vida prosseguir devagar...
Enquanto aguardo tão precioso momento, permito-me ouvir no ecoar
das batidas do coração aquela canção: “Eu quero uma casa no campo, do
tamanho ideal, pau-a-pique e sapê... Onde possa plantar meus amigos, meus
discos, meus livros e nada mais...”
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