Carlos
Alexandre da Silva Rocha
nasceu em Vitória-ES em 1988. Escreve desde os treze anos de idade e tem como
influências Drummond e os escritores simbolistas. Em 2008, lançou, pela Lei
Rubem Braga, o livro de poemas “Um homem na sombra”, que aparentemente se
coloca aos olhos do leitor como algo simples. Entretanto, como o livro versa
sobre as angústias humanas, ele torna-se não tão fácil de ser encarado. Carlos
Alexandre é formado em Letras-Português pela UFES e escreve no Blog Pierrô
crônico (www.pierrocronico.blogspot.com).
Confira, abaixo, a crônica “Cândida...”:
Cândida...
Acabei de escrever um
poema. A minha crítica literária não gostou muito não... Ela cagou em cima de
meus singelos versos. Cândida, a minha crítica literária, é a traça que mora na
gaveta de minha escrivaninha. Ganhou este nome depois que comeu, em apenas um
dia, todos os textos xerocopiados de Antonio Candido que eu mantinha em minha
gaveta como recordação de priscas eras de minha graduação. Após este dia,
apresento os meus textos para a Cândida. Ela é minha melhor crítica literária,
discípula direta de Antonio Candido, no fundo de suas entranhas.
Eu e Cândida temos códigos
de análise. Quando ela devora apenas metade, refaço todo o texto aproveitando a
metade que ela não comeu. Quando devora um salpicado de frases deixo como ela
opinou. Depois que Cândida surgiu em minha vida, consegui publicar em uma
editora. Dediquei o livro a Cândida, é claro.
“Para Cândida, com amor”.
Era a dedicatória! Fiquei sem namorada, ela chegou furiosa perguntando: “Quem é
essa piriguete?”
“É apenas uma traça”.
Respondi-lhe levantando a minha sobrancelha esquerda. Isso me dá certo ar
intelectual.
“Ah então é assim que
vocês chamam agora! Traça? Vem de traçar... Seu tosco pervertido”. Quando as mulheres assumem uma verdade, é
melhor confirmá-la, mesmo que seja mentira.
Nem deu tempo para
explicar, só vi uma sombra preta se aproximando da minha cabeça. É, meu caro,
você nunca sai impune de uma relação. Acordei três dias depois no labirinto
traumático do rascunho do inferno. Estava no corredor do hospital. Depois tive
que espremer meu ferimento da cabeça, tinha dois bernes morando no meu alto
corporal, um deve ser seguidor de Freud e o outro de Jung. Atena que não são...
Não sou nenhum Zeus. É só olhar a minha pança de chope.
Na minha ficha médica
estava escrito que o meu trauma fora por um impacto violento com algo maciço,
retangular – Meu Deus, o meu notebook! Com tanta coisa mais pesada, ela tinha
logo que quebrar o meu amado computador?!
Quando regressei, Cândida
estava deprimida. Dei-lhe uma autoajuda pra ver se cure, quando se está mal é
bom se empanturrar de porcaria...
Cândida anda perdendo
muito peso. Acho que deve ser sua nova alimentação regada a folheto de
publicidade. Estou sem papel e notebook, mas mesmo se o laptop estivesse vivo,
não poderia escrever. Estou sem luz. Escrevo estas memórias na parede de minha casa,
mas não tenho tinta, caneta, carvão... Nada digno para que eu possa escrever.
Como não tenho tinta,
escrevo com os meus dejetos fecais (cito-os assim, pois acho mais digno, mais
literário). Isso de escrever com a minha matéria fecal é uma ótima forma de
engrandecer a minha biografia e quem sabe sou abraçado pelo público leitão.
Vejo em minha mente manchetes de jornal: “Escritor vai à merda e se lambuza” ou
“Quem está na merda é pra se borrar”. Acho que não é uma boa propaganda. Serei
um novo Sade, mas sem nobreza e em terras tupiniquins? Estar na merda tem seu
lado positivo. O fedor é insuportável e por isso não recebo visitas.
Cândida ganhou consciência
de classe, está reivindicando melhores condições de trabalho. Há duas semanas
faz greve, acho que o “manifesto comunista” fez a cabeça e os intestinos dela.
O que posso fazer? Acabaram-se as propagandas...
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