sexta-feira, 27 de julho de 2012

LICENÇA CRÔNICA: CARLOS ALEXANDRE DA SILVA ROCHA


Carlos Alexandre da Silva Rocha nasceu em Vitória-ES em 1988. Escreve desde os treze anos de idade e tem como influências Drummond e os escritores simbolistas. Em 2008, lançou, pela Lei Rubem Braga, o livro de poemas “Um homem na sombra”, que aparentemente se coloca aos olhos do leitor como algo simples. Entretanto, como o livro versa sobre as angústias humanas, ele torna-se não tão fácil de ser encarado. Carlos Alexandre é formado em Letras-Português pela UFES e escreve no Blog Pierrô crônico (www.pierrocronico.blogspot.com). Confira, abaixo, a crônica “A separação”:

A separação

Ele chegou cabisbaixo, sem olhar para os lados, aparentemente chorou muitas noites, pois se viam incrustadas em sua pele profundas olheiras provenientes de noites mal dormidas. Sem nem cumprimentar os amigos sentou e deu um longo suspiro, que mais pareceu um ganido. Molhou os lábios e levantou o dedo, batendo logo após no balcão.

– Salva, um duplo da “mardita”, faz favor...

Seu Salvador, mais conhecido como seu Salva, proprietário de bar desde o nascimento, já conhecia o mal pela dose: “Essa é de corno”, pensou seu Salva enchendo o copo e tomando as medidas necessárias para que o cliente afogasse suas mágoas em um copo bem cheio de cachaça. Seu Salva colocou músicas românticas de preferência do cliente, além de deixar o litro aos olhos viços do bebedor.

Alfredo nem percebeu que já estava em seu segundo copo, virou todos como se fossem copos de água, já o terceiro foi impulsionado pela música romântica que começou a ser emitida pelas velhas caixas empoeiradas do bar, o templo dos desiludidos. Num rompante de tristeza, Alfredo começou a chorar, seu Salva, disfarçando o sorriso, enche não um duplo, e sim um triplo, que o Alfredo sorve sem pestanejar.

– Ela que me olhava com aqueles olhinhos que antecipavam as carícias e eu como um Octopus a protegia das intempéries, como se tivesse oito braços para lhe abraçar. Meus braços eram um Octopus’s garden, a salvá-la das violentas ondas da discórdia, como aquela música do Ringo Starr. E ela toda enrodilhada a me suplicar afetos, carícias, miúdos de minhas atenções... Agora ela se foi... Tudo por causa de uma maldita briga!

Para a alegria de seu Salva, uma triste comoção tomou conta do bar. Todos soluçavam e bebiam triplos, quádruplos... E o Alfredo, no seu monólogo de bêbado, continuava a declarar:

– Ela que me olhava com aqueles olhos que amoleciam meu coração e eu jogava migalhas de meu amor. Ela resoluta deglutia-as sem se queixar, tudo se foi... As vezes que subia em minha cama e dormíamos, eu abraçando-a, demonstrando todo o nosso amor. Outras ela surgia do nada chorando baixinho toda dengosa para que eu fosse sair com ela. Tudo se foi... Restaram-me apenas cantos e uma cama vazia.

Todos choravam com o relato apaixonado de Alfredo, não sabiam que ele amava tanto a sua mulher. Havia muito amor entre os dois! Ele, se sentindo demasiadamente inebriado pelos efeitos do álcool, ou apenas querendo ficar triste sozinho, resolve pedir a conta.

– Seu Salva, quanto que dá?

Após pagar a conta, um dos companheiros de copo resolve dar uma palavra de conforto batendo em suas costas.

– Não fique assim, Alfredo, dona Valéria verá a loucura que fez, abandonando um “home” como o senhor e voltará.

Assustado, Alfredo arregala os olhos e, esbravejando, acrescenta:

– Valéria?! Não é por essa que choro... É pela Molly, a minha cadela amada que foi levada, raptada, pela aquela desgraçada... Eu amo aquela cachorra!

Nenhum comentário:

Postar um comentário