sexta-feira, 1 de março de 2013

LICENÇA POÉTICA: IZABELA BRAVIN



Izabela Bravin, 17, capixaba e canela verde, ateia, vegetariana, feminista, simpatizante do comunismo, pretende cursar filosofia, adora chás e cafés amargos, gosta de andar pelada em casa, faz bolo aos domingos e morre de vergonha do que escreve. Confira, abaixo, o poema “Ao contrário”:



Ao contrário

A porta bate
barulho de chave
-Antes, porém, cabides-
-Antes, porém, vasos -

Agora a porta bate
e a chave tranca,
o armário nu
aplaude, com duas portas
resta a camisa manchada
que você não usa mais
deixou aqui em casa
tudo que não te faz falta
deixou aqui em casa
tudo que não te apraz
Restam, além, as minhas roupas
apenas, solitas
à sós: eu e elas
manchadas do teu cheiro
e o cheiro corta, e o cheiro volta
se eu fechar os olhos

A porta bate
ouço você "bom dia"
a alguém aqui na frente
"bom dia", o último, doravante
"bom dia", pra quem?
num tapa
a porta bate

---------------

A porta bate
barulho de chave
-depois, porém, camisas-
-depois, porém, flores-

Agora a porta bate
e a chave abre
as roupas de volta, os armários
arreganham, as duas portas
junto às camisas manchadas
as que você usa mais
trouxe aqui pra casa
tudo que me faz falta
trouxe aqui pra casa
tudo que me apraz
Restam, além, as mágoas
apenas, contidas
juntos: eu, você
encharcados do teu cheiro
que conforta, que me envolve
qu'eu agora sinto.

A porta bate
ouço você "saudade"
e é tudo diferente
"saudade", não mais, doravante
"saudade", d'alguém
num ato
a porta bate

ao contrário.

3 comentários:

  1. Gostei...na boa. Gostei mesmo.

    Iara

    ResponderExcluir
  2. A Izabela Bravin sempre me encanta e me surpreende com a espontaneidade de suas poesias recheadas de fascinantes versos tão bem engendrados.
    "Ao contrário" empanturra nossa imaginação de poder para sentir nossos cinco sentidos serem conduzidos a uma experiência de deleite em um universo de singelas e gostosas possibilidades cotidianas que só ela sabe criar. *-*

    ResponderExcluir