Nascido
em Ogidi, Nigéria, em 1930, o escritor, crítico e professor Chinua Achebe é um
dos mais lúcidos narradores do colonialismo europeu em África e, depois da
descolonização, um ser pouco desejado não só durante a Guerra Civil, mas também
pela ditadura que se seguiu e que transformou a Nigéria em um dos mais trágicos
países africanos da História recente. Exilado na Inglaterra e mais tarde nos
EUA, atuou na diplomacia durante os conflitos entre o governo Nigeriano e o
povo ibo, no final da década de 1960. Foi agraciado com o “Prêmio da Paz” oferecido
pela Feira de Frankfurt, na Alemanha, recebeu o “Man Booker International”, um
dos mais importantes prêmios das literaturas de língua inglesa. Morreu em 2013,
sem Nobel, porém com seguidores, e sua obra pôs a Nigéria em destaque na
literatura mundial. Ademais, no livro “A paz dura pouco” (1960), lançado recentemente
pela Companhia das Letras, Chinua Achebe versa acerca da corrupção e da
violência no continente africano.
O processo
No
livro “O mundo se despedaça”, Achebe escreve sobre o fracasso existencial de Okonkwo,
um ser que não consegue se adaptar às mudanças sociais e se perde entre as
exigências da tradição africana e as leis ocidentais. “A paz dura pouco” retoma
essa temática. A história se inicia com o julgamento de Obi Okonkwo, que é acusado
de receber uma propina de
valor irrisório. O grande tema do romance é a corrupção: “Depois de seu
encontro com o sr. Mark, Obi sentiu-se de fato um tigre. Tinha vencido sua
primeira batalha com um pé nas costas. Todo mundo dizia que era impossível
vencer. Diziam que um homem sempre espera que o outro aceite “cola” da mão dele
em troca de serviços prestados e, até que a pessoa faça isso, sua mente nunca
terá repouso. Obi sentia-se como um falcão inexperiente que apanha no bico um
pintinho miúdo e a mãe ordena que ele solte o bichinho, porque o pato não disse
nada, não fez barulho, ficou quieto”. Assim sendo, no decorrer do livro, é
apresentada a sucessão de eventos trágicos que levaram Obi ao Júri. Nascido em
uma pequena aldeia de etnia ibo, ele teve a oportunidade de estudar na
Inglaterra. Em Londres, desiste do curso de direito para se dedicar ao estudo
da língua inglesa. Conhece a bela Clara. De início, Clara rejeita Obi, mas os
dois se reencontram no navio de regresso à Nigéria e dão início a uma tumultuosa
história de amor. No entanto, relação deles é proibida: ela é uma osu, herdeira
de uma família de párias, proscritos da sociedade nigeriana. Além de tudo, Obi
enfrenta problemas financeiros. Empregado pelo governo, Obi se empenha no trabalho, mas afundado em
dívidas passa a aceitar propinas. Em um dado momento, cai em uma armadilha que
o faz ser processado e condenado.
Idealismo e poder
No
que tange a linguagem, a obra, a todo tempo, nos revela um discurso objetivo,
sucinto, a fim de capturar até o leitor mais desatento. Fabrício H. M.
Cassilhas pondera: “São freqüentes os momentos em que o narrador na obra de
Achebe acaba exercendo a função de tradutor. Essa ocorrência é relacionada
principalmente ao processo de Cushioning quando
o significado de uma palavra de origem ibo é explicado pelo próprio narrador.
Há uma quebra na narrativa para a explicação desse vocabulário. O mesmo
acontece com os elementos culturais. Esses, assim como o léxico ibo, são
explicados para o leitor quando a voz narrativa se afasta do mundo fictício
para explicá-lo, dirigindo-se claramente a um leitor modelo que, por sua vez, é
alheio a essa cultura”. Também sobre a linguagem de Achebe, Nadine Gordimer,
sul-africana e Nobel em 2001, destacou a capacidade invulgar de conjugar o riso
e o horror.
Por
fim, Achebe nos alerta para a reabilitação dos países africanos pré-coloniais,
seu discurso pretende manter viva a memória cotidiana do povo ibo e não
idealizar a vida em comunidade. “A paz dura pouco” trata dos conflitos pertinentes
de um mundo de migrações intensas e falta de identidade. É um romance acerca das
disputas entre o idealismo e o poder glamuroso do dinheiro, entre o desejo de
emancipação do indivíduo e as exigências dos antigos costumes. Embora trate de
temas amplos, como o choque de civilizações e a submissão dos filhos aos
preceitos e convicções dos pais, esta obra é também uma expressão máxima do
refinamento literário de um escritor dedicado em contar a história a partir do prisma
de África.
Fontes: Ricardo Salvalaio, Cia das
Letras, Blog “O Espanador”.
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